UE prefere apoiar as plantas atrativas e isso pode afetar a biodiversidade
A União Europeia precisa de um novo plano para conservar a sua biodiversidade, pois financia mais as plantas de latitudes mais a norte, com distribuição alargada e com flores azuis e roxas. As plantas também só recebem um terço da verba atribuída à conservação dos animais.
O alerta é de Ronaldo Sousa, do Centro de Biologia Molecular e Ambiental (CBMA) da Universidade do Minho, num artigo publicado na revista Biological Conservation com coautores da Itália, Finlândia e Suíça. Este trabalho avaliou o programa LIFE (programa da UE para o meio ambiente) entre 1992 e 2020, explorando a distribuição do financiamento na conservação de espécies e habitats.
“Em conservação usa-se o termo ‘cegueira das plantas’ para a desproporção no financiamento e no interesse por estas espécies quando comparada com os animais.É uma situação arriscada, pois com a extinção de plantas perde-se biodiversidade e ainda funções e serviços fulcrais como alimentos, materiais, mitigação da temperatura e armazenamento de carbono”, diz Ronaldo Sousa.
Este professor da Escola de Ciências da UMinho já tinha mostrado em 2020 que, no caso dos animais, o Programa LIFE também valoriza certas espécies carismáticas de vertebrados, como o urso, o lobo e o lince, tendo os invertebrados merecido apenas um sexto do investimento total.
“Todos os resultados obtidos podem ajudar a UE no desenvolvimento de ferramentas que visem alcançar metas de conservação de espécies que sejam mais abrangentes, sustentáveis e com maior equitabilidade na distribuição de fundos, independentemente do grupo taxonómico e da localização geográfica”, frisa o investigador. Ronaldo Sousa alerta assim para os enviesamentos estéticos e taxonómicos nos critérios de financiamento, que podem pôr em causa a conservação e extinção de espécies. “Há plantas e animais que continuam a ter investimento que idealmente deveria ser canalisado para espécies muito mais raras e em perigo de extinção”, constata o professor.
Ronaldo Sousa justifica os três critérios que dominaram a verba atribuída às plantas. A riqueza de espécies de latitudes a Norte é menor face às de países mediterrânicos como Portugal, onde abundam espécies endémicas e com elevado estatuto de conservação. Estas espécies a Sul recebem menor investimento devido, em parte, a questões políticas e à capacidade de mobilizar investimentos em conservação pelos países mediterrâneos. Já a distribuição alargada de determinadas espécies pode significar que há mais países interessados nesse investimento. Sobre a escolha de plantas azuis/roxas e também orquídeas, dever-se-á ao seu aspeto atrativo para os humanos.