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Liberdade é nome de mulher

Feminicídio, cultura da violação (ou também conhecido como cultura do estupro), violência obstetrícia, mutilação genital feminina, violência doméstica, assédio sexual, entre outros, são vocábulos que explanam a brutalidade patriarcal refletida na vivência das
mulheres. Os termos, que descrevem a violência e a discriminação da sociedade machista sentida pelas mulheres em formas bastante particulares, são tão numerosos que, infelizmente, poderíamos facilmente criar um dicionário específico para tal.

 


Estes fenómenos têm lugar em todo o mundo e nascem em qualquer tipo de lar. A violência não olha a classes sociais, a graus de formações, a culturas ou a países. Esta espalha-se como se fosse um vírus e deixa marca nas mulheres. Marcas psicológicas, físicas, emocionais e espirituais e estas marcas, marcam. Marcam as vítimas, as que sobrevivem e as que não resistem a tal desumanidade, marcam gerações de mulheres traumatizadas que vivem na sombra do medo, mas não parecem marcar suficientemente a sociedade nem os órgãos de poder pelos quais esta se rege.
Não marca certamente os polícias que mataram Mahsa Amini, de 22 anos, por esta não usar o hijab adequadamente.
Foi no passado dia 13 de setembro que Mahsa Amini foi presa pela Patrulha de Orientação – unidades policiais especiais encarregadas de garantir o respeito à moral islâmica – por, supostamente, violar a lei do hijab obrigatório do Irão ao usar seu hijab “inadequadamente” (alegadamente havia deixado alguns fios de cabelo visíveis sob o lenço na cabeça). Por conseguinte, de acordo com testemunhas oculares, Mahsa foi severamente espancada por oficiais da Patrulha de Orientação, uma afirmação negada pelas autoridades iranianas.

 
 


Irão não permaneceu indiferente à crueldade machista fatal que Mahsa Amini sofreu. Protestos e greves foram desencadeados, por todo o país, pelo assassinato policial de Mahsa e estes estão em marcha, apesar de repressões sangrentas e da asfixiação da opinião popular
pelo corte da Internet por parte das autoridades. Lê-se nos cartazes “Mulher. Vida.
Liberdade.”. As diretrizes destas manifestações não poderiam ser mais claras e as reivindicações mais sensatas.


Segundo a Iran Human Rights (IHRNGO), uma organização de direitos humanos sem fins lucrativos com membros dentro e fora do Irão, até à data, pelo menos 448 protestantes morreram incluindo 51 crianças. A 30 de novembro de 2022, as autoridades da República
Islâmica relataram sentenças de morte contra manifestantes, algumas das quais foram até confirmadas pela Suprema Corte. Pelo menos três crianças também enfrentam acusações de pena de morte. O Diretor de Direitos Humanos do Irão, Mahmood Amiry-Moghaddam, alega:
“Os manifestantes estão a ser condenados à morte em julgamentos espetaculares sem acesso a seus advogados e devido processo legal. Estas sentenças não têm validade legal. O povo do Irão e a comunidade internacional devem enviar uma forte mensagem de que a execução de manifestantes não será tolerada”.

 
 


A conjuntura política do Irão, nomeadamente a repressão de direitos humanos, demonstram várias facetas do mundo político, tanto a nível macro como a nível micro, merecedoras de análise. Primeiramente, a nível macro, o silêncio e a falta de resposta por parte da comunidade internacional torna-se cada vez mais gritante. Esta coletividade de Estados e organizações, não se demonstra capaz de auxiliar as vítimas nem de dar bases a estes países para fomentarem órgãos de poder assentes nos direitos humanos. Num segundo
plano, a nível micro, além da inércia do Estado iraniano em casos de violação de direitos humanos já assinados, devemos exaltar a incontestável bravura das mulheres iranianas. Estas não se conformam com o machismo e dão a vida pela independência e a voz pela
emancipação. Mesmo na iminência de serem alvo de desfechos fatais, as mulheres iranianas saem à rua e reivindicam aquilo que lhes é mais primal e visceral: a liberdade.


A rua pela qual a marcha tem lugar parece não ter fim.
Mudemos o sistema, a opressão e a violação. Mudemos o dicionário da mulher.

 

Texto de: Jéssica Pereira

Artigo publicado em parceria com a Associação de Debates Académicos da Universidade do Minho

 

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