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Obrigado União Europeia

A União Europeia é a única forma de construirmos um projeto sustentável para o planeta, tendo como pilares a solidariedade, o respeito mútuo entre povos, a erradicação da pobreza e a proteção dos direitos humanos, ou pelo menos é isso que a propaganda Europeia, que
consumimos diariamente, nos quer fazer acreditar.

 
Rui Rodrigues


A ideia da construção de um projeto Europeu, surgiu nos cacos de uma Europa destruída pela segunda guerra mundial, que via o seu estatuto de principal potência mundial a desvanecer, com o crescimento dos Estados Unidos e da União Soviética. Não se deixando ficar, seis países assinaram uns quantos tratados económicos com o objetivo de estabelecer políticas comuns, criar um mercado único e de provar ao mundo que a Europa Ocidental ainda era uma potência a temer.

 
 


Aí está a primeira “red flag” do projeto Europeu, este surge no contexto de uma guerra fria em que as duas novas maiores potências mundiais andavam a mostrar os seus brinquedos novos e a Europa estava determinada para não ser deixada de fora, então, enquanto os Estados Unidos e a União Soviética andavam a mostrar os seus Ferraris e Lamborghinis, a CEE decide aparecer com o seu FIAT 500 restaurado. Isto para dizer que a Europa no pós-guerra teve oportunidade de criar um verdadeiro projeto social diferenciador, mas decidiu ir atrás das grandes potências, priorizando o desenvolvimento económico à força toda porque não estava preparada para
deixar de ser a maior força mundial.


Hoje, o contexto geopolítico mundial é similar ao que era quando a CEE foi criada. Continuamos numa dicotomia Ocidente vs Oriente, contudo a agora União Europeia, com 27 estados-membros, entendeu que não é a maior potência económica mundial, levando a uma
mudança de abordagem na comunicação do projeto Europeu, criando a narrativa que a União Europeia é um projeto social e que a Europa “está mais à frente” que os outros continentes.

 
 


Infelizmente, não é preciso muito para perceber que o projeto Europeu apenas levou uma nova pintura e que o maior objetivo continua o mesmo desde a sua criação, o crescimento económico, custe ele o que custar, existindo imensos exemplos disto. Apesar dos conhecidos efeitos da não tão longínqua crise económica das dividas soberanas, em que a UE e o BCE, não mexeram um dedo para ajudar a mitigar os catastróficos efeitos sociais sofridos nos países mais afetados, a estratégia Europeia não parece ter evoluído.


Hoje, com a crescente pressão inflacionista, vemos o Banco Central Europeu a anunciar aumentos de taxas de juros, ou seja, a estratégia Europeia para lidar com a inflação é induzir uma recessão na economia, ou em termos leigos, pressionar as finanças dos agregados
familiares, de forma a que estes consumam menos, levando a que empresas vendam menos e despeçam trabalhadores, que por sua vez vão consumir ainda menos, levando a mais despedimentos e mais pressão na família e no Estado. Uma estratégia eficaz, com certeza,
para travar a inflação, mas com consequências para o Estado, famílias e empresas, que se podem vir a alastrar por anos e anos.

 


Face a estes problemas da União Europeia, o que podemos fazer? Nada. A União Europeia graças ao seu excelente marketing é quase intocável no que toda a críticas, não é coincidência que dentro dos partidos com representação em Portugal, apenas o PCP tenha abertamente uma agenda anti-Europeia, dizer mal da União Europeia é extremamente impopular, tanto que mesmo o Bloco de Esquerda deixou cair do seu discurso críticas à Europa.


Isto acontece porque somos bombardeados constantemente com um marketing cuidadoso pró-europeu, nas escolas o programa glorifica o sucesso do projeto europeu, nos meios de comunicação as medidas europeias não são questionadas, as gerações que viveram o 25 de
abril e a entrada portuguesa na União Europeia dizem constantemente: “Eu lembro-me do que era este país antes da União Europeia”.
É nesse último ponto que me vou focar de seguida, a União Europeia é frequentemente enaltecida como tendo sido o motor do crescimento económico dos países, e efetivamente Portugal depois de entrar na União Europeia cresceu, mas será que todo esse crescimento pode ser atribuído a essa entrada?

 


Portugal sofreu com quase 50 anos de ditadura, onde reinava uma economia fechada ao mundo. Com o 25 de abril, ao pouco a economia portuguesa foi-se abrindo ao mundo e mesmo com um início de democracia atribulado, marcado por instabilidade política, nos 11 anos entre 1974 e a entrada portuguesa na UE, a economia portuguesa cresceu, em média, 3,3%. Nos 10 anos seguintes, a economia portuguesa cresceu, em média, 4,1%. Em parte, esse crescimento, deveu-se sem dúvida à União Europeia, mas assumir que sem a União Europeia, Portugal continuaria no nível económico da década de 80 é falacioso, isto para dizer que sem dúvida a União Europeia contribuiu um pouco para o desenvolvimento português, mas a sua importância é altamente sobrevalorizada.


Apesar de ter passado vários parágrafos a dizer mal da União Europeia não significa que deseje o fim desta, contudo acho imperativo, enquanto sociedade Europeia, desmitificarmos a ideia que fomos salvos pela UE e começarmos a perceber que o projeto europeu não é um mar de rosas e que pode ser melhorado. Quando críticas à União Europeia dominarem o debate político esta realmente sentirá pressão para mudar algo e quiçá, não estaremos condenados a respostas a crises que não tem o mínimo de consciência social, cujas decisões são tomadas por uma autocrata não eleita de uma União que neste momento é tudo menos democrata.

 

Texto de: Rui Rodrigues

Artigo publicado em parceria com a Associação de Debates Académicos da Universidade do Minho

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