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Travessia Aérea do Atlântico Sul

Lisboa – Rio de Janeiro
30 de Março a 17 de Junho de 1922

 

Há 100 anos, a 17 de Junho de 1922, o navegador Gago Coutinho e o piloto Sacadura Cabral, oficiais da Marinha Portuguesa, completavam a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, cobrindo uma distância de 8 383 km entre Lisboa e o Rio de Janeiro.

 
 
gago coutinho
Foto do “Lusitânia” sobrevoando os Penedos de São Pedro e São Paulo a 18 Abril de 1922 | via Museu de Marinha

Esta travessia, ainda que compreendendo 62 horas e 26 minutos de tempo voado, decorreu, entre 30 de Março de 1922 e 17 de Junho de 1922, ao longo de um intervalo de tempo de 79 dias, tendo sido usados 3 hidroaviões Fairey F III e enfrentadas, ao longo de 10 etapas, as mais variadas e arriscadas contrariedades.

A primeira etapa da viagem inicia-se a 30 de Março de 1922 em Lisboa, com o Fairey F III-D MkII “Transatlantic”, n.º 11 (F400), “Lusitânia”, rumo às Canárias onde chegariam nesse mesmo dia. A partida para a etapa seguinte tem lugar a 5 de Abril de 1922, ligando a Baía de Gando nas Canárias ao Mindelo em Cabo Verde, onde chegariam nesse mesmo dia. A 17 de Abril de 1922 inicia-se a etapa seguinte, primeiro do Mindelo para a Praia e desta rumo aos Penedos de São Pedro e São Paulo. A amaragem junto aos Penedos, a 18 de Abril de 1922, face à ondulação, resulta na perda de um flutuador e leva ao afundamento da aeronave, sendo os aviadores resgatados e retirados para Fernando de Noronha pelo cruzador NRP “República” (ex-HMS Gladiolus) da Marinha Portuguesa.

 
 

A 27 de Abril de 1922 parte de Lisboa o cargueiro brasileiro “Bagé” transportando outro hidroavião, o Fairey F III-B n.º 16, “Pátria” / “Portugal” (F401), para que fosse possível retomar a travessia a partir dos Penedos. A viagem reinicia-se a 11 de Maio de 2022, a partir de Fernando Noronha, rumando aos Penedos (para garantir a continuidade da travessia) e, a partir destes rumariam ao Recife. Surge nova contrariedade, já no voo de regresso dos Penedos, com avaria do motor a obrigar a amaragem que os deixa à deriva a cerca de 300 km de Fernando de Noronha. São resgatados, Às 6h00 de 12 de Maio de 1922 por um cargueiro inglês, o “Paris City”, da Reardon Smith Line, comandado por A. E. Tamlyn, em trânsito na região, “en route” de Cardiff para o Rio de Janeiro. No decurso da operação de resgate dos aviadores, o hidroavião afundar-se-ia.

Para garantir a continuidade da travessia, a 24 de Maio de 1922, o cruzador NRP “Carvalho Araújo” (ex-HMS Jonquil) parte de Lisboa com o terceiro e último hidroavião disponível, o Fairey F III-D n.º 17 (F402), “Santa Cruz”. A travessia é retomada, nos Penedos, a 5 de Junho de 1922, com os aviadores a alcançarem o Recife pouco depois do meio-dia. A 8 de Junho de 1922 ligam Recife a Salvador. A 13 de Junho de 1922 ligam Salvador a Porto Seguro. A 15 de Junho de 1922 ligam Porto Seguro a Vitória e, finalmente, a 17 de Junho de 1922 amarou em frente à Ilha das Enxadas, nas águas da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro.

 

Gago Coutinho desenvolveu e usou com sucesso dois importantes instrumentos e métodos/tabelas de navegação aérea – o corrector de rumos (em parceria com Sacadura Cabral e com o apoio de Ortins de Bettencourt) e o sextante com horizonte artificial. Graças aos mesmos foi possível, além da exigente navegação da travessia como um todo, o feito de alcançar o “pequeno ponto” dos Penedos de São Pedro e São Paulo (geo-referenciação 0.916944, -29.345833), um arquipélago de 15 pequenas ilhas rochosas, com 15 km2 e ume elevação máxima de apenas 17 metros, a 625 Km a Nordeste de Fernando Noronha, e parte do estado brasileiro de Pernambuco. Foi descoberto a 20 de Abril de 1511 pelo navegador português Garcia de Noronha “en route” para a Índia e visitado por Charles Darwin a 16 de Fevereiro de 1832, onde procedeu a trabalho de investigação e documentação sobre o respectivo ecossistema.

Volvidos apenas 2 anos após alcançar a Baía de Guanabara, Sacadura Cabral viria a perder a vida, no Canal da Mancha, com 43 anos, a 15 de Novembro de 1924, ao transportar de Amsterdão para Portugal um hidroavião Fokker 4146. Sacadura Cabral é tio de Helena Sacadura Cabral e tio-avô de Miguel Portas e Paulo Portas.

 

Gago Coutinho, natural de São Brás de Alportel, Faro, viveria até aos 90 anos, falecendo em Lisboa, a 18 de Fevereiro de 1959, um ano após ter sido promovido a Almirante. Foi aprovado em Conselho de Ministros, a 15 de Junho de 2022, que o Aeroporto Internacional de Faro ( IATA: FAO | ICAO: LPFR) passará a designar-se por Aeroporto Gago Coutinho.

O hidroavião “Santa Cruz”, com outras duas aeronaves Fairey III-D, prestou serviço em Macau afecto ao respectivo Centro de Aviação Naval, ali estabelecido em 1927 na Ilha de Taipa. Está actualmente patente em exposição no Museu de Marinha, em Belém, Lisboa.

 

Artigo publicado em parceria com “Espada & Escudo”

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