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O debate e oratória feminista

As lutas feministas – a luta por a mulher conseguir livremente ocupar os lugares de poder e de fala – remontam, como todos nós sabemos, há anos – aliás, séculos – atrás, e a sua evolução é mais que notória.

 
mulheres manifestação mulher
Imagem Ilustrativa


No período entre 1926 e 1974, segundo o Movimento Democrático das Mulheres (MDM), no campo laboral: as mulheres ganhavam menos cerca de 40% que os homens; a lei do contrato individual do trabalho permitia que o marido pudesse proibir a mulher de
trabalhar fora de casa; e as mulheres não tinham acesso a carreiras da magistratura, diplomacia, exército e polícia. No seio familiar, o casamento católico era indissolúvel, mães solteiras não tinham qualquer proteção legal, o marido tinha o direito de abrir a correspondência da mulher e até 1969, a mulher não podia viajar para o estrangeiro sem autorização do marido.

 
 

No que toca à saúde sexual e reprodutiva, a publicidade dos contracetivos era proibida e o aborto era punido em qualquer circunstância, com pena de prisão de 2 a 8 anos. Estimavam-se os abortos clandestinos em 100 mil/ano, sendo a terceira causa de morte materna. Quanto aos direitos cívicos e políticos, até final da década de 60, as mulheres só podiam votar quando fossem chefes de família e possuíssem curso médio ou superior.


Estes são alguns exemplos de formas de opressão que as mulheres tinham de enfrentar todos os dias, uma realidade que atualmente nos parece inconcebível e na maioria das vezes nem nos lembramos que tivemos de lutar, e muito, para que ações e leis destas deixassem de ser normalizadas.

 
 


A Revolução de Abril, através da democracia e da vontade popular expressa nos órgãos de poder, deu-nos as ferramentas para construir os alicerces de uma sociedade mais igualitária no que toca aos direitos dos homens e das mulheres, ou seja, uma sociedade mais feminista e justa. Rompemos o paradigma vigente alterando as perceções que regiam a nível social, económico, político e interpessoal. Mas qual foi o caminho, além da revolução democrática, para chegarmos até aqui? Fatores marcantes são, certamente, a oratória e o debate.


A voz das feministas sedentas de direitos nunca baixou nem se calou. Estas mulheres, a partir da oratória, tinham que persuadir uma comunidade machista sendo assertivas e defendendo sempre o seu ponto de vista nunca baixando os braços. Tinham, a partir da arte
de bem falar, de destruir tabus e estereótipos comprovando com precisão aquilo que defendiam com unhas e dentes. “Ain’t I A Woman?”, nome dado a um discurso feito de improviso pela ex-escravizada e ativista dos direitos das mulheres, Sojourner Truth, é o
exemplo mais vívido desta era histórica.

 

Proferido na Convenção de Mulheres em, Ohio, em 1851, Truth argumentou enquanto a cultura estaduniense colocava, metaforicamente, as mulheres brancas sobre um pedestal e lhes concediam certos “privilégios”, como por exemplo, o de não ter de exercer atividades remuneradas por sua suposta inferioridade intelectual e física, esta atitude não era estendida às mulheres negras, acostumadas com o trabalho braçal.


O discurso foi feito em resposta a um dos palestrantes do sexo masculino, o qual aparentemente estava na plateia.
Feministas de épocas passadas, nomeadamente as da 1ª e 2ª onda do feminismo, que lidavam com um sistema patriarcal mais acentuado, necessitavam obrigatoriamente de desenvolver esta característica de modo a chegarem quer ao mundo do Direito, que fazia leis sobre o seu corpo e sobre a sua vida, quer ao mundo da Medicina, que desenvolvia métodos que influenciavam a sua saúde, quer ao mundo da opinião pública e dos media, que construíam a narrativa sob qual a sociedade se ia fixar sobre estas mulheres, entre outros
mundos da esfera societal.

 


A verdade é que, em última instância, podemos mesmo afirmar que é o debate o grande meio repercutor das mensagens e das reivindicações feministas.
Por este mesmo motivo, não nos deixemos enganar quando menosprezam o debate ou quando consideram que este é secundário. Este terá sempre o seu marco na história e, com certeza, será o protagonista de muitas mais revoluções.

Jéssica Pereira

 

Artigo publicado em parceria com a Associação de Debates Académicos da Universidade do Minho

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